a malta anda toda a dar de frosques


Estava escrito num canal de televisão nacional qualquer coisa deste género:

"Qual é a taxa de abandono escolar em Portugal, segundo a União Europeia, nos jovens entre os 18 e os 24 anos?"
Apresentavam-se depois três percentagens, para ver se nós acertávamos na correcta.

Fiquei a olhar para aquilo, como boi pra palácio.
Continuamos na mesma?
Então os nossos "jovens" dos 18 aos 24 têm todos de estudar e, mais, de gostar de estudar, com as perspectivas de ensino que lhes são apresentadas?
"Jovens" dos 18 aos 24 anos? Hã? Aos 18 já se trabalha bem, aos 24 já se pode ser responsável por uma família, ter filhos e tal.
Estudar?
E se não for essa a nossa tendência? Se um "jovem" de 23 anos tiver muito jeito para arranjar sapatos, aprende onde? E nós precisamos de calceteiros, homens do lixo, trolhas, gente para atender nos supermercados e nos restaurantes, gente nova nas artes, na música, na cerâmica, na tradição dos tapetes de Arraiolos, tal como precisamos de engenheiros, arquitectos, dótores, enfim.

Esta malta dos 18 aos 24 anda a dar de frosques da escola? Pudera!
Já têm idade para trabalhar, seguir um percurso que não tem necessariamente de passar por uma qualquer escola, pelo menos da maneira como o ensino está estruturado, actualmente.

Se eu não gostasse de andar na escola, com essa idade, até eu dava de frosques, puxa!

Que raio de mentalidade!

espatifa!

Isto de apetecer espatifar tudo é muito bom!
Desconstruir, surpreender, acabar de vez com os condicionalismos que vêem sei lá eu de onde!!

Estou com esta vontade de partir tudo à minha volta - todos os anos em Abril/Maio dá-me isto; deve ser a febre dos fenos!! - de mudar, de dar pontapés nas pedras da calçada e nalguns rabos, também.
E mais! Todos os medos desaparecem e apetece-me ir para a rua, cantar, dançar, gritar, ralhar.
Estou descontente, porra!

Apetece-me espatifar tudo! Dizer as minhas verdades, cair em contradições, cometer erros, fazer disparates, dizer tudo o que me passa pela cabeça!




Quero férias já!
Quero que acabem as hipocrisias, disfarçadas de diplomacias ocas.
Estou farta de frases compridas, para dizer coisas curtas!
Quero que me digam a verdade! Seja ela qual for!
Quero dar murros em certas caras e quero que me devolvam os murros, que não me apetece dar nada a ninguém de graça!
Sou assim, e depois?
Alguém tem alguma coisa contra? Se tem, que me diga já, em vez de dizer pelas costas, à laia da verdadeira cusca de bairro (disfarçada de cargos e nomes que não valem um caraças)!
Sou assim! Ponto!
Quero que venham debater comigo! Debatam! Digam de sua justiça! Eu direi da minha (com murros e pontapés incluídos!).

Saiam da casca e atrevam-se a enfrentar-me, despida que estou de qualquer medo e consequência!
É agora! E é já!
É que eu vou espatifar isto tudo!

Ora lá está!

"Continuamos a ser especialistas em falar sobre aquilo de que não percebemos nada".

António Feio

Provérbio

Deitar tarde e cedo erguer,
não sei se dá saúde, mas dá uma soneira do caraças!

estrabismo

Estava ela a estacionar o seu VW Beetle preto, com capota de abrir.
Estacionou e saíu do carro.
Alta, morena, cabelo comprido escuro e óculos de sol (daqueles que nos transformam em olhar de moscas).

Arranjou-se depois de sair. Compôs as botas pretas, justas , de salto alto, que lhe subiam para cima do joelho. Esticou o vestido preto com bolas às cores, leve como o verão que se aproxima. Debaixo do braço, a mala cor de laranja, a condizer com as cores das bolas do vestido.
Feminina, deu um jeito, também, no anel que trazia no anelar esquerdo, um anel vistoso e grande.
- Caramba, que mulherão! - dizem os homens à minha volta.
A minha resposta simples:
- Eu conheço-a. Ela é estrábica...
- Olha que porra! Invejosa!!

olhares desarrumados


Temos o olhar desarrumado.
Depois de estar sentada, durante algum tempo, no café, vejo como as pessoas entram, sem olhar; vêem o suficiente para direccionar os passos e não tropeçar ou cair. Dirigem-se ao local para onde pretendem ir, com o olhar perdido. Olham para todo o lado, para o balcão, para os bolos, pães de leite, pastilhas elásticas, mas não olham a funcionária que as atende directamente nos olhos.
- É uma bica, se faz favor. Curta.
Olhos postos no porta-moedas, para tirar 50 cêntimos (ou mais); mãos inquietas à procura das moedas.
A funcionária, ocupada a tirar o café, não olha o cliente nos olhos, enquanto arruma a chávena sobre o pires, põe a colher e o açucar.
Entrega a bica, recebe o dinheiro e não olha o cliente de frente.
Depois, há quem apareça de óculos de sol. Dão estilo e dão jeito - não se vê a desarrumação do olhar.


[Lembrei-me de um amigo meu que trabalha com terapias complementares. Ele diz que não devíamos sequer usar óculos de sol; que assim os olhos nunca se habituam, de forma natural, à luz a que são expostos; que - diz ele - os nossos olhos já vêm com essa capacidade. Perdem-na gradualmente, à medida que os tapamos com lentes de cores, usando a justificação que os estamos a proteger. Afinal - diz ainda ele - é ao contrário, que os desprotegemos.]

Estive um bom bocado a apreciar os olhares desarrumados, a reparar para onde olham as pessoas e como o fazem.
Reparei que, diariamente, e desarrumando o olhar, não estabelecemos contacto; vi olhos desassossegados, gestos rápidos e ansiosos, e falta de contacto.

Parece que temos medo de nos encontrar - olhos nos olhos.
E nem nos apercebemos disso.


[Foto de PP]